Crânio

Tumores encefálicos em adultos têm uma importância crescente na saúde das populações de todo o mundo. Apesar de serem relativamente raros, quando comparados com outras doenças, observa-se aumento significativo da incidência de tumores do sistema nervoso central (SNC) nas últimas décadas. A razão para tal observação é multifatorial, sendo que as causas mais citadas são o aumento do tabagismo entre mulheres e adolescentes, maior expectativa de vida da população em geral, facilidade de acesso a serviços médicos, melhoria das técnicas diagnósticas e melhor tratamento dos cânceres primários. Aproximadamente 200.000 novos casos de tumores do SNC são diagnosticados anualmente nos Estados Unidos da América, sendo que cerca de 160.000 são casos de metástases encefálicas. Tumor cerebral consiste na principal causa de óbito por tumor sólido em homens menores que 20 anos, segunda causa de óbito por câncer em homens entre 20 e 29 anos e quinta causa em mulheres entre 20 e 39 anos.

NEUROCIRURGIAS PARA TUMORES CEREBRAIS

As tecnologias e técnicas cirúrgicas avançaram muito nos últimos anos. Associadas às melhorias dos cuidados pós operatórios em UTIs especializadas permitem os bons resultados atingidos com as cirurgias neurológicas para ressecção destes tumores. Podemos citar como avanços tecnológicos, que permitem amplas ressecções com mínimas ou ausentes sequelas, os modernos microscópios cirúrgicos, neuronavegadores, aspiradores ultrassônicos, estereotaxia, ultrassom intraoperatório, vídeo-endoscopia, entre outros.

A indicação para se retirar cirurgicamente ou não um tumor cerebral leva em conta vários fatores. Analisa-se pelos exames de imagem (ressonâncias e tomografias) a probabilidade de o tumor ser maligno ou benigno; a quantidade de lesões existentes; o efeito compressivo exercido sobre o cérebro e sinais de hipertensão intracraniana; a localização do tumor e as dificuldades/facilidades de acesso sem causar sequelas; idade do paciente; condições clínicas do mesmo e presença de metástases em outras localidades. A decisão de se operar ou não deve ser tomada em conjunto pelo neurocirurgião e o paciente, e em casos de tumores malignos o médico oncologista também deve ser consultado.

Os pacientes com tumores benignos podem ser curados através de ressecção cirúrgica completa do tumor, sem necessidade de tratamentos complementares. Quando estes tumores são pequenos, assintomáticos e a ressonância indica fortemente que realmente sejam benignos, pode-se optar por não realizar nenhum tratamento, acompanhando-se com ressonâncias periódicas.
Nos casos de tumores cerebrais malignos após a cirurgia os pacientes são tratados com radioterapia e/ou quimioterapia, conforme indicação do oncologista. Em alguns desses casos pode-se também optar por não realizar a neurocirurgia, dependendo das condições clínicas e oncológicas do paciente.

Neuronavegador tumor

EPIDEMIOLOGIA

A atual classificação da Organização Mundial de Saúde (OMS) para tumores do SNC (OMS 2000) lista mais de 120 tipos de tumores cerebrais. Este sistema prevê quatro graus ascendentes de malignidade (grau I a IV).

A classificação de tumores cerebrais é um processo complexo sendo que a cada nova revisão entidades tumorais antigas são descartadas das listas em substituição de tumores recentemente reconhecidos. Até o presente momento as classificações se basearam fortemente em características morfológicas e imunohistoquímicas.

Com o progressivo avanço das descobertas e metodologias moleculares e genéticas, as classificações destes tumores tendem a se modificar num futuro próximo baseadas nestes novos conhecimentos.

Descrevemos abaixo uma listagem geral dos aspectos epidemiológicos dos principais tumores que acometem o encéfalo.

TUMORES PRIMÁRIOS DO SNC

Aproximadamente 43.000 novos casos de tumores primários malignos e benignos são anualmente diagnosticados nos EUA. Cerca de 50% correspondem a tumores de origem glial e 30 % de origem nas meninges, porém estes dados variam de acordo com a faixa etária, etnia, sexo e localização no SNC.4

1. GLIOMAS

Glioma é um termo referente a qualquer neoplasia derivada de células gliais e compreende astrocitomas, oligodendrogliomas, ependimomas, tumores derivados do plexo coróide. Gliomas infiltrativos são os tumores primários mais comuns do sistema nervoso central (SNC), sendo 40% dos tumores primários e 78% dentre os tumores primários malignos que acometem o SNC. Mais de 80% destes tumores são considerados gliomas de alto grau (graus III e IV) quando classificados de acordo com os critérios da OMS, sistema baseado na diferenciação morfológica das linhagens astrocíticas, oligodendrogliais e mistas, além de graduação de malignidade conforme características histológicas.

Tumores grau I tem comportamento biológico e histológico benignos, sendo quase sempre curativos após ressecção cirúrgica total. A transformação maligna e recorrência destes tumores são eventos raros.
Os tumores graduados de II a IV têm comportamento histológico e biológico malignos e são classificados conforme critérios histológicos bem definidos, discutidos nos capítulos subsequentes.

Os gliomas de alto grau, grau III e IV, constituem 77% dos casos de tumores malignos primários do SNC, sendo destes, 82% representados por glioblastoma multiforme – GBM ( OMS grau IV) . A incidência é maior entre 65 e 75 anos, e homens são mais afetados que as mulheres. A sobrevida mediana diminui com o avanço da idade.

2. TUMORES MENÍNGEOS

Meningeomas são, em sua grande maioria, tumores de crescimento lento, originados das células da aracnóide. As meninges da convexidade cerebral, foice, base do crânio e coluna espinhal são os locais mais acometidos, embora esses tumores possam crescer em qualquer lugar em que haja células aracnóideas, como plexo coróide e locais extracranianos de restos ectópicos meningoteliais. São neoplasias comuns, aproximadamente 30% dos tumores primários do SNC, e são diagnosticados principalmente em mulheres de meia idade.

Existem nove subtipos histológicos de comportamento benigno, sem diferenças prognósticas, e que podem ser descritas pelo patologista simplesmente como meningeomas. Estes são os meningeomas típicos, classificados como OMS grau I. Porém, baseado em características histopatológicas e suas correlações com comportamento mais agressivo e tendência de recorrência,
ainda podem ser classificados como atípicos (grau II) e anaplásicos (grau III).

3. TUMORES NEUROECTODÉRMICOS E EMBRIONÁRIOS

Meduloblastomas (OMS grau IV) são os tumores embrionários intracranianos mais comuns e são tumores da fossa posterior. Este tumor ocorre principalmente em crianças com média de idade de 7 anos. Mas existe um segundo pico de incidência em adultos de 20 a 40 anos de idade.
Estes tumores têm uma tendência inerente de se disseminarem por via liquórica. Atualmente os pacientes tem uma taxa de sobrevida de 5 anos de 50 a 70%. São fatores de pior prognóstico idade menor que 3 anos, metástases, ressecção parcial e a variante histológica de grandes células.

Tumores Primitivos Neuroectodérmicos Supratentoriais (PNETs)
Os tumores com características semelhantes aos meduloblastomas, mas que crescem fora da fossa posterior são classificados neste grupo dos PNETs (OMS grau IV). Exemplos destes tumores são os pineablastomas e retonoblastomas.
Os PNETs supratentorias aparecem principalmente em crianças jovens. Geralmente são tumores agressivos. Há disseminação em 11 a 40% dos casos.

4. OUTROS TUMORES PRIMÁRIOS

Hemangioblastoma é um tumor benigno (OMS) que afeta adultos jovens. São tumores sólido-císticos que crescem predominantemente no cerebelo. São em sua maioria tumores esporádicos, porém 25% estão associadas à doença de Von Hippel- Lindau.
O ependimoma é um tumor que se origina de células ependimárias do sistema ventricular, filamento terminal ou canal medular. Existem três variantes histológicas conforme classificação da OMS: grau I ou mixopapilar, grau II ou clássico, e grau III ou anaplásico. É responsável por aproximadamente 6 a 9 % dos tumores em SNC em crianças e adolescentes entre 0 e 19 anos. Cerca de metade dos pacientes são diagnosticados antes dos 5 anos de idade, com freqüência proporcional entre meninos e meninas. Aproximadamente 90 % são intracranianos (66% na fossa posterior) e 10 % são intramedulares. Cerca de 7% dos casos apresentam disseminação ao diagnóstico, sendo necessária, portanto a realização de RM de neuroeixo e pesquisa de células neoplásicas no LCR antes de se iniciar o tratamento.

Tumores neurais são tumores com diferenciação neuronal pura e de rara incidência. Existem 4 subtipos benignos com componente neuronal puro classificados como OMS baixo grau (Gangliocitoma, gangliocitoma displástico, neurocitoma central, paraganglioma do filamento terminal) e 2 subtipos OMS alto grau (ganglioneurobalstoma e neuroblastoma cerebral).
Tumores glionerais tem diferenciação mista. Há 3 subtipos de tumores glioneurais mistos (Ganglioglioma desmoplastico, ganglioglioma, tumor neuroepitelial disembrioplastico). O ganglioglioma (OMS grau II) é o tumor mais comum associado a epilepsia do lobo temporal.
Os pineocitomas são tumores OMS grau II, de crescimento lento em adultos jovens. São tumores bem delimitados, geralmente com boa evolução após ressecção cirúrgica. Os pineoblastomas são tumores primitivos neuroectodérmicos (PNET) agressivos (OMS grau IV). Estes têm a tendência em se disseminar pelo LCR, e têm um prognóstico desfavorável mesmo após cirurgia, RDT e QT.

Os tumores de células germinativas do SNC são divididos em germinomas e tumores não germinoma, que incluem teratoma, tumor de saco vitelino, carcinoma embrionário, coriocarcinoma e tumores de células germinativas mistas. Os Germinomas do SNC afetam estruturas da linha média, principalmente a região da pineal. Outros locais possíveis são a região selar e gânglios da base. Os tumores não germinomas supracitados também acometem principalmente a região da pineal..

Linfomas primários e secundários podem acometer o SNC. Os linfomas primários são tumores de adultos. Sua incidência aumentou nos últimos anos devido ao aumento de sobrevida de pacientes imunossuprimidos, como os portadores de SIDA e transplantados. Acomete geralmente o parênquima cerebral em locais diversos, incluindo região cortical e subcortical, regiões periventriculares profundas, lesões solitárias ou múltiplas, ou até em asa de borboleta no corpo caloso. Em contraste, os linfomas secundários acometem a dura mater ou leptomeninges. A biópsia estereotática é o método de escolha para o diagnóstico. Os linfomas do SNC são sensíveis a esteróides, porém o efeito é temporário e pode dificultar o diagnóstico. Com tratamento radio e quimioterápico a sobrevida em 2 anos chega a 70% e em 5 anos até 45% em pacientes imunocompetentes.

Craniofaringeomas são tumores epiteliais das regiões selar e suprasselar (OMS grau I). Este tumor tem uma prevalência aproximada de 1-3/100.000 pessoas. Representa 2 a 5% de todos os tumores cerebrais e possui distribuição bimodal, com dois picos de incidência, dos 5 aos 10 anos e dos 65 aos 74 anos, sendo que cerca de 50% ocorrem na infância. Acomete igualmente homens e mulheres.

5. METÁSTASES ENCEFÁLICAS

Metástases encefálicas são muito importantes dentro da neurooncologia, pois muitas vezes são causas de situações emergenciais e devem ser prontamente diagnosticadas. Muitos tumores causam metástases encefálicas por disseminação hematogênica. Os locais mais comuns são as regiões subcorticais cerebrais ou cerebelares, onde as embolizações tumorais geralmente se implantam.

As neoplasias secundárias são os tumores mais freqüentes do SNC, sendo que se estima 200.000 novos casos por ano só nos EUA. Existem tumores que classicamente cursam com metástases em SNC, são as mais comuns: carcinomas de pulmão, câncer de mama, melanoma, carcinoma renal de células claras e tumores colo-retais. A incidência e prevalência de metástases do SNC está em aumento devido a maior sobrevida dos pacientes com câncer, melhora técnica dos exames de imagem, aumento da incidência de carcinoma pulmonar e melanoma. O quadro clínico depende da localização do tumor e muitas vezes é a primeira manifestação da doença sistêmica ainda não diagnosticada (16 a 35%)

Moderno aparelho de neuronavegação utilizado durante cirurgias para localização de tumores cerebrais, evitando-se lesões cerebrais